terça-feira, 8 de setembro de 2009

A arquitetura maior...


E dizei-me, que possuís vós nessas habitações? E que objetos guardais atrás dessas portas trancadas? Acaso possuís a paz, esse impulso tranqüilo que revela vossa potência? Possuís as recordações, essas abóbadas cintilantes que amarram os cumes do espírito? Possuís a beleza que conduz o coração dos objetos confeccionados com madeira e pedra para a montanha sagrada?
Dizei-me, possuís tudo isto em vossas casas? Ou tendes somente o conforto e a cobiça do conforto — esse desejo furtivo que entra em casa como visita, e depois torna-se hóspede, e depois dono? Sim, e torna-se também domador e, com forcado e açoite, reduz a títeres vossos desejos mais amplos. Embora suas mãos sejam de seda, seu coração é de ferro. Ele embala-vos até dormirdes, só para rondar vosso leito e zombar da dignidade de vossos corpos, zomba também de vossos sentidos normais e deita-os na penugem macia como um vaso frágil. Na verdade, vossa paixão pelo conforto assassina as paixões mais nobres de vossa alma e, depois, zombeteira, marcha no seu enterro.
Mas vós, filhos do espaço, vos os inquietos no repouso, vós não caireis em armadilhas nem sereis domesticados. Vossa casa não será uma âncora, mas um mastro. Não será uma fita reluzente que recobre um ferimento, mas uma pálpebra que protege o olho. Não dobrareis as asas para poder atravessar as portas, nem curvareis as cabeças para não bater nos tetos, nem retereis vossa respiração para não sacudir e abalar as paredes. Não morareis em tumbas feitas pelos mortos para os vivos. E apesar de sua magnificência e esplendor, vossa casa não conterá vosso segredo nem abrigará vossa nostalgia. Pois aquilo que é ilimitado em vós, mora no castelo do céu cuja porta é a bruma da aurora e cujas janelas são os cânticos e os silêncios da noite.

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